segunda-feira, dezembro 17, 2012

MenteQueSentes - Homenzinhos

Os homens que deixaram a construção de um navio a meio
porque pressentiram o seu naufrágio.

Os homens que encostaram a enxada à entrada da horta
porque imaginaram uma tempestade.

Os homens que deixaram uma palavra por dizer
porque não pensaram no silêncio.

Morreram.

sábado, novembro 17, 2012

MenteQueSentes - O trolley que ria

Ainda caminhavam pelo chão
já o trolley se ria.
No primeiro céu
haviam pedaços de nuvem a entrar na conversa
e o trolley descansava.
Pela noite, arrumada
no centro de cada mundo
prolongaram todas as conversas que não tiveram
e o trolley escolheu não aparecer.
E com a saudade veio o regresso
aquecido pelo tinto dos sorrisos
e o regatear numa língua estrangeira
o trolley ria mais do que no ínicio.
Passada novamente a fronteira
pousaram os abraços
e o trolley nunca mais deu notícias.

terça-feira, outubro 09, 2012

MenteQueSentes - Momento absoluto

Parei. Nem sei se parei. Parei. Nem sei se parei.
Essa indefinição aproximou-me dele. Melhor. Levou-me com ele pelos caminhos de um cenário que não existia, por um sopro que procuro e procuro, cada vez que me estico num apeadeiro.
Fui. Nem sei se fui. Fui. Nem sei se fui.
E só cheguei porque há vozes que não são humanas, e que dentro de uma cabine de emoções só se fazem ouvir pela indiferença. Tudo dizem, nada trazem. Separam.
Quando cheguei, a pergunta era a mesma de quando parti. Ou pensei que parti.
Porque é que ele a dava?
O rio sorria. A ponte baloiçava. O céu aguentava tudo.
E a música nunca acabou, porque não há dinheiro que a segure.

quarta-feira, setembro 26, 2012

MenteQueSentes - Album de recordações

Em cima dos degraus não havia pés
nem da porta caía areia.
Ainda assim,
as pessoas não paravam de entrar
ao ritmo de quem agora tem tempo
para trazer coisas de volta.

domingo, agosto 05, 2012

MenteQueVives - Acento no orgulho

Pediu-me ajuda para se sentar junto a mim no degrau. Com a minha mão apertei-lhe o antebraço e ele confiou no amparo. O seu corpo não escondeu a dificuldade de movimentos, e levou-me a pensar como iria levantar-se se eu já ali não estivesse. Ele percebeu e adiantou a resposta com o acento igual ao orgulho que tinha desenhado no rosto. Disse-me, que preferia ter apenas o conforto de alguém durante a queda, do que herdar o mérito de se erguer. E reforçou, que se assim não fosse seria o princípio para cair sozinho.
Vim-me embora mais cedo porque quis garantir que seria mesmo assim e que iria trazer comigo aquele pedaço de vida, intacto, genuíno. Talvez um dia viesse a precisar dele.

quinta-feira, julho 26, 2012

MenteQueSentes - Arte de ser avô

A arte de ser avô
está escondida no riso dos netos
no abraço pequenino que nunca acaba
nos olhos que contrariam a idade
e voltam a ter espaço
para guardar coisas

segunda-feira, julho 02, 2012

MenteQueSentes - Planeta inventado


Mamã, Papá
hoje na minha escola inventámos um planeta
nele riscámos o céu e ficou lindo
sujámos as mãos e elas procuraram outras
criámos castelos para visitar quando formos adultos
e soltámos gargalhadas que trago no bolso.
Ah e decidimos que as horas eram só a fingir
tal como aquilo que vocês usam como desculpa
para não inventarem mais planetas.

quarta-feira, junho 13, 2012

MenteQueSentes - A chamada

Não senti a chamada.
O mundo preencheu-me
as horas encavalitaram-se
os sons fundiram-se.
Agora, agradeço à magia
o lápis de cera por estrear
limpo como o inicio
presente como um liço
alinhado como o chão.



sexta-feira, maio 11, 2012

MenteQueSentes - Morreu o outro lado da mão

Não foste tu que morreste
foram as teclas do piano
foi o outro lado da tua mão
foram os recados do teu corpo
foi o banco, o silêncio, o aroma
todas essas coisas
que se guardam para amanhã.
Não foste tu que morreste
estás aí a tocar
e eu estou aqui a viajar
pela ponta dos teus dedos.

(a Bernardo Sassetti 1970 - 2012)


sexta-feira, maio 04, 2012

quarta-feira, abril 25, 2012

MenteQueSentes - O porquê

O "porquê"
sai, espeta-se e dobra o medo.
Mas não tem de magoar.
Rompe com o passado
e na vertigem que recebemos
voltamos a atirar os dados.

Só isso.


terça-feira, abril 17, 2012

sábado, março 31, 2012

MenteQueSentes - Dez passos

Um, dois, três passos
na direcção de uma outra morada
na sequência das pedras
por cima de outros caminhos.

Quatro, cinco, seis passos
a confirmar os três primeiros
a precipitar um novo rasto
e não há verbo que me faça parar.

Sete, oito, nove passos
se houvessem dúvidas, estaria descalço
sem fraquezas não há escusas
e foi assim que sai de casa.

Dez passos
cheguei e renasci.

quinta-feira, janeiro 05, 2012

MenteQueVives - O sorriso que se passa

A mais velha baixou-se para ver melhor o caderno aberto pela mais nova. Não percebi se o sorriso da mais velha era de ternura pela resposta fácil que teria. Ou se era para dar confiança a uma dúvida, multiplicada pelas borbulhas no rosto da mais nova.
Não cheguei a perceber, porque entretanto terminei de contornar a rotunda. Mais uma a caminho de qualquer coisa.
Mas foi fácil imaginar as borbulhas a desaparecerem, quando junto dos colegas o caderno foi novamente aberto. E entre a explicação de tudo, apareceu para sempre, o sorriso da mais velha na boca da mais nova.